sábado, 25 de novembro de 2006

apoio psicológico ao doente terminal e à família

texto sacado da internet

-Apoio psicológico ao doente canceroso
O doente oncológico necessita de um grande suporte psicológico, particularmente em dois aspectos: primeiro, aprender a viver com a sua doença, depois no período terminal, aceitar o seu fim.
Para atingir estes objectivos, é necessário um contacto frequente com o doente e família, condição essencial para definir as suas necessidades. No entanto, estas só podem ser constatadas quando o doente e a família forem colocados a par da verdade sobre a sua situação.
Existem várias fases nas reacções destes doentes à doença:
-Fase de negação: existe uma recusa do diagnóstico. Esta negação explica algumas atitudes consideradas como ilógicas por parte do doente (não realização de terapêutica ou de exames complementares).
-Fase de revolta: os doentes podem ser agressivos e até violentos. Todos os doentes e familiares atravessam esta fase. Nesta fase é extremamente difícil manter uma relação com o doente, pelo que o médico deve ser especialmente compreensivo perante as atitudes do doente.
-Fase de negociação: o doente compreende o risco ligado à evolução da doença, que começa a ser aceite sob reservas e mediante um certo número de condições (poder ir de férias, não fazer este ou aquele exame). As condições impostas devem ser negociadas e todos os tratamentos e exames complementares explicados e motivados.
-Fase de depressão: é o pano de fundo de toda evolução psicológica. Esta fase de depressão psíquica e moral, deve ser combatida pelo doente e família. A integração desta na atitude terapêutica é essencial e permite prevenir a desinserção familiar do doente oncológico.
-Fase de aceitação: nem sempre é alcançada e raramente é estável. Esta fase deve ser mantida o máximo tempo possível, o que ajuda muito a família a viver o processo de luto.
A ajuda ao doente só é possível se este tiver confiança na equipa médica, não só no aspecto técnico, mas também se tiver a certeza que alguns dos seus direitos serão respeitados. Os mais importantes destes são o direito à opinião (ex. possibilidade de participar nas decisões terapêuticas) e o direito à esperança.


- Comunicação em Oncologia
O médico é um técnico capaz de aplicar conhecimentos científicos para prevenir e tratar as doenças. Para isso, ele necessita de comunicar com o doente, ouvindo e falando. Estas duas vertentes são inseparáveis.
O doente oncológico durante a quase totalidade do tempo de evolução da doença permanece lúcido, com completa capacidade intelectual e afectiva. Trata-se de doentes conscientes da gravidade da sua situação, o que condiciona uma atmosfera psico-afectiva densa. A morte está!
Devemos ter sempre presente que o doente é uma pessoa e a relação interpessoal doente-médico, representa o eixo principal na prática da medicina. Raramente ausente, essa relação é muitas vezes preponderante, como nos casos das afecções não orgânicas, ou nas patologias orgânicas quando existem alterações psíquicas (oncologia).
Os princípios sobre os quais se fundamenta a relação médico-doende têm por objectivo respeitar os interesses do doente, a sua autonomia e a sua dignidade. Para que isto aconteça é necessário que exista autenticidade na comunicação.
O doente inicialmente fica bastante perturbado pelo aparecimento da doença na sua vida. Ele vai ter necessidade de conhecer a verdade. É frequente revoltar-se contra o médico, mas se a informação for veiculada de forma verdadeira, este ressentimento vai durar pouco tempo. Consciente da gravidade do seu estado, uma boa relação com o seu médico é uma base de apoio importante. Esta passa por uma boa comunicação, que vai inspirar um clima de confiança no doente. Pelo contrário, a ausência de comunicação pode representar uma fonte de sofrimento, ligada a um sentimento de solidão no combate à doença e contra a morte.
Uma boa comunicação melhora a cooperação do doente e a participação na realização de exames complementares e tratamentos.
Igualmente, quando a comunicação é eficaz, ela contribui para desdramatizar as situações sérias. É necessário inverter a fórmula "nenhumas notícias = a más notícias". Uma relação suficiente e verdadeira, permite ao médico não revelar todas as más notícias (não relevantes para o doente), sem perder a confiança do paciente.

12.2.1. - Princípios da comunicação médico doente
A comunicação tem um duplo sentido: para o médico, é tão importante saber ouvir, como saber falar.
O doente tem necessidade de ser escutado, de exprimir as suas preocupações, de colocar questões. O médico tem necessidade de o ouvir para ter conhecimento dos seus problemas e para melhor o apioar. Cada doente é único e ignora que as questões que coloca ao médico, já foram postas inúmeras vezes por outros doentes. Mas o médico sabe que o doente é único e para além de preocupações gerais, tem problemas próprios, que embora pequenos são importante.
O doente tem necessidade que lhe falem, para sentir que foi ouvido e que os seus problemas foram compreendidos.
Doente e médico estão ligados por um diálogo único, mas não se podem alhear do meio que os rodeia, particularmente o familiar, que pode diluir ou reforçar esta ligação. O médico deve ter consciência do seu lugar privilegiado, mas não exclusivo. O doente tem inúmeras fontes de informação:
-informação directa do médico
-comentários entre médicos
-informação directa de outros técnicos de saúde
-informação directa de familiares, religiosos, amigos, juristas, ...
-modificações dos cuidados médicos habituais
-mudança no local de internamento
-auto informação, dossiers médicos, livros, revistas
-sintomas que modificam o estado geral
-respostas evasivas, quando questiona em relação ao futuro.

- Dificuldades na comunicação
Na realidade uma consulta com um doente oncológico, não é diferente de qualquer outra. As tabelas seguintes resumem alguns dos principais problemas existentes na comunicação.

Tabela 12.1
Causas de desconforto para o médico na relacção com o doente
Situação
Reacção do médico
Doença incurável ou terminalDoente hostil, insuportávelDoente mentalDoente dependenteDoente não cumpridor
Sentimentos de impotência,de frustraçãoHostilidade, regeiçãoImpaciência, frustraçãoSatisfação inicial, depois impaciência e culpabilidadeDesaprovação, cólera,frustração

Tabela 12.2
Principais causas de comunicação insuficiente no decurso de uma consulta e formas de a melhorar
Consultas que não satisfazem o doente e meio onde é realizada
Melhor técnica de consulta
-O doente não exprime as suas preocupações.
-O que pensa ser essencial, não lhe é explicado.
-Não recebeu nenhuma informação sobre a sua doença
-Melhor interrogatório; ouvir e dispor de tempo suficiente, sem lhe cortar a palavra.
-Informar, sempre que possível, o diagnóstico e a causa da doença.
-Falta de qualidade nas relações interpessoais.
-Ambiente desfavorável
-Percepção do médico como um técnico frio e distante.
-O médico coloca questões íntimas
-Preservar uma atmosfera calorosa e acolhedora.
-Ambiente calmo e sóbrio
-Adoptar uma atitude amigável ainda que distante
-Evitar fazer a consulta na presença de estranhos.
Não compreende
Simplificar a linguagem
-A informação dada é muito difícil de compreender.
-O doente tem concepções erróneas, fonte de mal-entendidos.
-Evitar gíria médica
-Usar termos simples, e frases curtas.
-Adaptar a linguagem à personalidade de cada doente, usar exemplos do dia a dia.
-Alguns doentes têm dificuldade em acompanhar a conversa, por deficiências.
-Controlar se compreederam.
-Falar lentamente, suficientemente alto.
-Usar representações cronológicas e topográficas. Fazer esquemas.
Falta de memória
Melhorar a memorisação
-Excesso de informação numa só consulta.
-Não percepção, da hierarquia das informações.
-Emoção parasita.
-Fragmentar a informação nas consultas sucessivas.
-Dar as informações mais importantes em primeiro.
-Dar informações escritas.
-Dar conselhos precisos e concretos, em lugar de informações vagas e gerais.
O médico às vezes opta por soluções relativamente à comunicação com o doente, que na realidade recusam essa comunicação.
A mais simples é a negação; tal como o doente que se recusa a aceitar a sua situação, o médico aceita que tudo está bem e que não existe qualquer problema. Muitas vezes nem sequer pondera se tem ou não problema de comunicação.
Instituir rotinas e protocolos é uma situação ambígua. É útil, porque com o hábito, a definição de linhas de conduta simplificam o comportamento. É perigosa, porque se pode cair na tentação de aplicar as regras e os protocolos sem discernimento, sem ter em conta as características particulares de cada doente.
O médico perante cada doente, deve apreender a personalidade do seu interlocutor, reconhecer as suas características e adaptar a sua conduta, não só à doença, mas também ao doente. O médico deve ter em conta que perante uma situação patológica, não existem respostas esteriotipadas. Tal como uma terapêutica medicamentosa, a comunicação deve ser adaptada a cada doente e deve ser moldada ao longo do tempo conforme as reacções, muitas vezes imprevisíveis.
Um princípio de veracidade é indispensável a uma relação autêntica, sem a qual não se pode estabelecer um clima de confiança recíproca. A reacção de negação é um mecanismo de defesa do doente, que pode ser momentâneamente útil e como tal, deve ser respeitada. No entanto na maioria das vezes é substituída por uma tomada de consciência da realidade. A principal negação diz respeito à prespectiva da morte, sempre presente logo que um cancro é diagnosticado ou somente suspeitado. Os individuos vêm-se confrontados com uma realidade complexa e em mudança, o que vai desencadear reacções complexas e díspares.

12.2.3 - Como informar
Muito esquematicamente a informação deve ser adaptada a cada doente, e a cada situação, isto é, à evolução da neoplasia. Esta informação deve ser fragmentada ao longo do tempo, à medida que se realizam os exames complementares e se faz a terapêutica. É feita em linguagem clara, adaptada ao contexto sócio cultural do doente e sem gíria médica.
A radioterapia tem tanto de eficaz como de mítico e a palavra "raios" pode levantar objecções difíceis de contornar. Igualmente, quando tem que se propor quimioterapia, é melhor falar de "actividade", com as suas duas vertentes (eficácia e efeitos laterais), do que da sua toxicidade.
O médico é habitualmente o principal responsável por comunicar com o doente. No entanto em oncologia é raro que seja um só médico a intervir. Em todas as circunstâncias o Clínico Geral é um interlocutor privilegiado, que conhece o doente, a família e o contexto em que estes se inserem. Numa equipa oncológica, existe um interlocutor preferêncial para cada doente, responsável de transmitir as informações mais importantes, de discutir com o doente as decisões mais cruciais.

Como dar As Más notícias
1-De uma forma simples, sem muitos detalhes técnicos.
2-Ter em conta que o doente, muitas vezes já percebeu a situação.
3-Conseguir um ambiente o mais calmo possível.
4-Fragmentar as informações.
5-Aguardar perguntas complementares que o doente possa colocar.
6-Não discutir aquilo que o doente se recusa a reconhecer.
7-Perguntar ao doente se ele compreendeu bem, se necessita de informações adicionais.
8-Não suprimir a esperança.
9-Nada dizer que não seja verdade
O tempo é um elemento determinante para uma boa comunicação. Há momentos propícios e outros em que o doente se encontra de tal modo fechado sobre si mesmo, que quase não é possível comunicar. Por vezes transmitir a informação ao longo da consulta, ou de várias consultas, é útil, pois permite ao doente digerir o que ouviu, tal como metaboliza os fármacos que lhe prescrevemos.
A comunicação médico-doente é determinante para a adesão do doente à realização de exames complementares e à terapêutica. Apesar do que está em jogo em oncologia, a adesão dos doentes não é tão boa como se poderia esperar. Alguns doentes sentem-se irremediavelmente condenados e como tal, "não têm nada a perder", não seguindo por isso o conselho dos médicos. A adesão vai depender das características do tratamento. Estas devem ser simplificadas o mais possível desde que tal não comprometa a eficácia. Os que menos cumprem são os homens, os idosos, os jovens e os marginais. Nestes casos, o médico deve estar de sobreaviso e fazer um esforço adicional para motivar o doente, explicando-lhe o tratamento e tentando reduzir os seus inconvenientes sociais (ex.: alterar o horário ou esquema posológico de administração dos fármacos; aplicar um sistema com bomba infusora).
O doente oncológico recorre com frequência à "medicina tradicional ou natural". O médico tem a tentação imediata de desencorajar estes métodos, porém, tal pode funcionar ao contrário. Assim, tem de se dialogar naturalmente, dando a entender que se conhecem esses métodos, que é difícil dizer se são ou não úteis. O médico deve deixar transparecer que está aberto a novos métodos que possam ser úteis. No entanto, estes têm de estar demonstrados como seguros e eficazes, para não expôr o doente a tratamentos sem qualquer validade e que possam mesmo acarretar riscos para a sua saúde. Após esta informação correcta, o médico tem a liberdade de se insurgir contra alguns tipos de prática, que não visam mais do que explorar o paciente, mantendo-se contudo à disposição do doente para o continuar a tratar ou para posterior ajuda.

12.3 - O Doente Terminal
"...a morte do homem, a morte de cada homem, sendo um acontecimento natural não é um acontecimento trivial, não é nunca trivial. O fim natural da minha vida, a minha morte é para mim, como ser consciente, o mais importante acontecimento da minha vida; é por ser finita, por ser limitada no tempo, que a vida individual tem o grande valor que todos lhe atribuimos. Viver um tempo limitado é um desafio grandioso, orienta os nossos desejos e as nossas escolhas, faz-nos correr para uma meta que não vemos mas que sabemos, de certeza certa, que está lá nesse ponto sem retorno, nessa fronteira invisível entre o estar vivo e o estar morto."
Daniel Serrão

A assistência aos doentes terminais faz parte da prática médica. Nos últimos anos este acompanhamento tem sofrido grandes evoluções, particularmente com a dissolução que se tem assistido dos laços familiares por um lado, e por outro, com o aumento dos cuidados médicos prestados ao moribundo, em unidades próprias.
As neoplasias não são as únicas doenças fatais. As doenças cardio-vasculares ultrapassam-nas e são a primeira causa de morte. As condições de morte dum doente com cancro tem por vezes características que explicam a fórmula , ainda que caricatural, "doença longa e dolorosa".
A evolução terminal de um doente canceroso tem um curso habitualmente progressivo e por vezes, demorado, o que torna a morte previsível. Mesmo que ocorra uma complicação fatal não previsível, a degradação do doente é habitualmente progressiva e perceptível para as pessoas que com ele contactam.
O estado de consciência dos doentes raramente está perturbado. Particularmente os idosos podem ter uma certa alteração do estado de consciência. Isto significa que as possibilidades de comunicação com o doente estão conservadas, o que pode ser uma vantagem ou uma desvantagem.
A importância na clínica do acompanhamento de um doente terminal com cancro deve-se por um lado, à frequência deste, e por outro, à duração por vezes prolongada durante a qual os diferentes problemas vão surgindo; estes são acompanhados de um sofrimento físico e moral muitas vezes subvalorizados.

Causas de Morte
Há causas de morte evitáveis, relacionadas com complicações potencialmente fatais, mas que se controladas, podem adiar vários meses a morte. Tais complicações são urgências oncológicas e dependem da localização da doença e dos tratamentos efectuados. A maioria pode ser prevenida através de medidas próprias que não devem ser negligênciadas sob o pretexto de pensar que "o doente tem cancro, está perdido". As complicações mais frequentes são:
-Hemorragias e infecções, devidas a aplasias medulares, muitas vezes reversíveis.
-Insuficiência respiratória aguda
-Complicações neurológicas
-Complicações metabólicas (ex. hipercalcemia)
A maior parte das vezes a causa de morte resulta de uma alteração grave de um orgão vital: invasão pleuro-pulmonar, metástases hepáticas, hipertensão intracraneana,... Com a progressão da neoplasia, a degradação do estado geral vai favorecer uma complicação terminal.
Existem complicações terapêuticas como em todos os tratamentos. Com os citostáticos as complicações são mais frequentes e intensas do que com outras terapêuticas (ver capitulos sobre terapêutiuca oncológica).
Apesar de ter um cancro, o paciente pode vir a morrer de outra causa que não a neoplasia, particularmente os idosos.

O que fazer?
O médico que acompanha um doente terminal deve ter uma competência técnica, que faz com que ele não possa ser substituido por outra pessoa; a intervenção do enfermeiro pode ser complementar, mas não substitutiva. Os conhecimentos para controlar a dor, combater uma obstipação ou corrigir as alterações hidroelectrolíticas devem ser rigorosos.
As situações encontradas são muito variáveis de um doente para outro, e mesmo de um dia para o outro no mesmo doente. Estas, mesmo que graves e brutais, não devem ser fonte de desorientação. Numa situação em que o doente tem pouco tempo de vida, a qualidade desta é extremamente importante. Os cuidados dispensados ao doente têm por isso mesmo como principal objectivo reduzir os sintomas de desconforto, preservar a autonomia e a motricidade do doente.
As necessidades do doente são muito diversificadas e podem mudar de um dia para o outro. Para nos apercebermos destas mudanças é necessário uma boa comunicação, permitindo-lhe expressar as suas insatisfações e necessidades. Ele sente necessidade de uma segurança relativa no período de desconforto e perigo que atravessa. Tem necessidade de estar em contacto com o médico assistente, de ser ouvido de o ouvir. Tem necessidade de conforto. Tem necessidade de ver os seus interesse reconhecidos e respeitados, independentemente do seu teor, numa atmosfera de confiança e confidencialidade.
Tudo o que atrás foi dito consome tempo. O tempo é indispensável para lidar com estas situações, mas para o doente, são talvez o melhor testemunho de vida e de esperança. O tempo de vida do paciente é breve, mas é o que lhe resta. Desta forma, todas as vivências deste período vão ter uma intensidade enorme. Não é raro que o moribundo, nos últimos dias de vida, tome decisões e conclua projectos que há muito vinha adiando.
Uma avaliação global da personalidade do moribundo é indispensável. Diz-se que a dor no moribundo é "total": física, social, mental (psicoafectiva) e espiritual. O médico deve tentar minorar estes aspectos, contribuindo assim para que a angústia seja menor. Quando a situação é bem acompanhada o número de pedidos de eutanásia activa diminui, pois quando este surge, muitas vezes resulta de uma tremenda angústia que não foi entendida ou que não foi controlada da melhor maneira.
De certa forma os cuidados necessários num doente terminal não são diferentes daqueles prestados no início do processo mórbido. A proximidade da morte apenas os torna mais evidentes, mais imperativos e as possibilidades de cura foram já ultrapassadas. As necessidades de alguns doentes oncológicos que estão prestes a morrer, são muitas vezes mínimas e o seu fim é calmo e sereno. Pelo contrário, alguns familiares podem necessitar de uma ajuda maior "para viver", porque tudo será sombrio e diferente.

Principais cuidados
Vão depender dos sintomas experimentados pelos doentes, que se encontram representados na tabela seguinte.

A maioria das atitudes terapêuticas são dirigidas aos sintomas conforme estes vão surgindo. Vamos dar alguma ênfase aos aspectos que permitem preservar a autonomia do doente o maior tempo possível.
A importância da motricidade pode ser avaliada pela peso que este parâmetro tem nas escalas de karnofsky e na da OMS (tabela 12.4). Ela pode ser alterada por diversos factores: fenómenos dolorosos, redução das diferentes funções ósteo-articulares, intelectuais, fadiga provocada pela insónia, alterações neurológicas, hipercalcemia... Uma infantilização do doente, com cuidados injustificados (ex.: comer na cama, higiene indivídual na cama), devem ser evitadas para que o tempo de imobilazação seja reduzido ao indispensável. Impede-se assim que o doente entre num ciclo vicioso que cada vez lhe irá agravar mais as funções motoras, a anorexia, a hipercalcemia, as alterações tróficas e o estado psicológico. Terapêuticas sintomáticas (em particular antálgicas), recomendações higiénicas e fisioterapia, que façam com que o aleituamento (durante todo o dia) só ocorra alguns dias ou semanas antes da morte, são aconcelhaveis ( ver capítulo recuperação funcional pós cirurgia).
Tabela 12.4

ESCALA DE KARNOFSKY
100% - normal, assintomático
90% - sintomas mínimos
80% - actividade normal com algum desconforto
70% - incapaz de actividade normal, mas autónomo
60% - por vezes necessita de ajuda
50% - tem com grande frequência necessidade de ajuda e de cuidados médicos
40% - o estado não permite cuidar de si próprio
30% - é necessário hospitalização
20% - necessita de cuidados intensivos
10% - moribundo, progressão rápida para a morte.

Escala da OMS
grau 0 - actividade normal, sem restrição
grau 1 - actividade física diminuida mas ambulatória; pode trabalhar
grau 2 - ambulatório capaz de tratar de si próprio, incapaz de trabalhar aleituamento inferior a 50% do tempo
grau 3 - capaz de alguns cuidados, acamado ou em cadeira mais de 50% do tempo.
grau 4 - incapaz de cuidar de si próprio, permanentemente acamado ou em cadeira.

A alimentação deve ser variada, quer no tipo de alimentos, quer no horário, segundo as alterações do paladar do doente (o prazer de comer é importante no equilibrio dietético). Deve atender-se ao apetite ou às causas de disfagia. A secura bucal necessita de uma higiene local muito estrita, é agravada por alguns medicamentos, e reduzida por uma boa alimentação. Uma sonda gástrica ou alimetação parenteral só se justifica se o doente não conseguir deglutir. A obstipação é agravada por uma alimentação desiquilibrada e também por fármacos como a morfina, pelo que é necessário muitas vezes a administração de laxativos.
A insónia tem numerosas causas orgânicas e psicológicas. Deve haver um bom controle da dor, e sempre que necessário, deve administrar-se um ansiolítico sedativo.
Uma dispneia pode ser melhorada por um tratamento etiológico, corticóides ou morfina em baixas doses. A tosse seca irritativa, pode necesssitar de terapêutica com codeína (o que agrava a obstipação). A incontinência dos esfincteres, implica a existência de medidas de higiene rigorosas; a algaliação ou colocação de um saco colector, reduz os inconvenientes da incontinência urinária.
As lesões neoplásicas ulcerosas ou que tenham qualquer outra solução de continuidade, devem ser desinfectadas e feito um penso para evitar a infecção e os odores que por vezes acontecem.
Alguns moribundos passam por uma fase de agitação terminal, que pode ser provocada por uma nova complicação ou até mesmo não ter causa aparente. A morfina, a levopromazina, a cloropromazina ou haloperidol, a par da presença do médico, são usualmente suficientes.
Qualquer atitude deve ser ponderada num sentido lógico, pesando as vantagens e os inconvenientes, com as adaptações necessárias segundo a evolução dos doentes.

Suporte Psico-Social
O Clínico Geral não é o único responsável por este tipo de apoio, mas é o elemento fulcral:
-pela sua intervenção técnica destinada a proporcionar conforto ao doente.
-pela organização dos cuidados que implicam a intervenção de terceiras pessoas (enfermeiro, fisioterapeuta) e por vezes pela coordenação que tem que fazer entre estes elementos.
-pelos conselhos que pode dar aos familiares no sentido de melhorar o acompanhamento ao moribundo. Ajudar um doente, não é maternalizar ou infantilizar.
O doente moribundo é um ser vivo até ao último sopro e como tal deve ser considerado. Devem ser-lhe prestados todos os cuidados possíveis e rodea-lo de familiares e amigos. O médico pode ajudá-los a suportar esta fase difícil, tal como certas reacções desagradáveis do doente, mas compreensíveis. A proximidade da morte é muitas persentida pelo doente que sente desejo de falar. A prespectiva do fim que se aproxima é muitas vezes acompanhado de esperanças multiformes: a de ter sido bem sucedido durante a vida, a de não deixar aqueles que ama em dificuldades materiais ou afectivas, a de ter deixado sucessores, a de não ter sido abandonado prematuramente, a de poder ter um fim calmo. Até ao último momento a incerteza quanto a este (quando e como vai acontecer) persiste e o doente pode estar, ou muito agitado ou pelo contrário, aparentar uma profunda calma.
O moribundo deve ser considerado como pessoa e não como "o moribundo", entendendo-se com isto que deve existir um respeito e uma confiança recíproca também estendida ao cônjuge. Para o médico, o assegurar-lhe um fim digno deve ser mais gratificante do que conseguir curas dolorosas.
A maioria das mortes ocorre no hospital mas no entanto há uma tendência para que tal se inverta, particularmente nos casos em que existe uma evolução progressiva em que é possível organizar os cuidados a prestar aos doentes. Porém, a decisão do doente permanecer no domicílio pode ser alterada, particularmente quando acontece uma complicação que necessite de internamento hospitalar.
Para o Médico de Família, existem por vezes muitas apreensões sobre a morte. Esta resulta frequentemente da falta de conhecimentos de cuidados paliativos. Desta forma, a existência de unidades de internamento para prestar assistência a estes doentes pode ter algumas vantagens.

Carta do doente terminal

-direito a ser tratado como uma pessoa viva até à morte
-direito à esperança
-direito a exprimir os seus sentimentos
-direito a participar nas decisões médicas
-direito aos cuidados contínuos para um conforto físico e moral
-direito à morte sã e a não sofrer
-direito a uma resposta honesta às questões
-direito à ajuda familiar e a que a sua família seja ajudada na aceitação da morte
-direito a morrer em paz e dignidade
-direito de fazer uma opção médica, religiosa ou espiritual, mesmo que aparentemente contrarie as crenças dos outros indivíduos.

12.4 - A FAMÍLIA
O homem é um animal sociável, inserido na sociedade. O primeiro círculo que o envolve é a família, entendida, em sentido largo, para além dos laços de sangue. Quando um dos seus elementos adoece, o conjunto da célula familiar reune-se e reage para tentar ajudar o elemento que está em perigo. As reacções, por vezes complexas e evolutivas, vão desenvolver-se durante a progressão da doença e podem ser tão deletérias para a própria família como a doença o é para o doente.
O Médico de Família, conhecendo o agregado familiar antes de ocorrer a doença, está numa posição ideal para se aperceber das alterações que estão a acontecer, despistar os riscos e eventualmente intervir. Por um lado, pode dar-lhes instruções sobre a melhor forma de ajudar o doente, por outro pode minimizar o efeito da doença sobre a família. O diagnóstico de um cancro num dos elementos pode favorecer a coesão de uma família até então desunida, ou ter o efeito contrário.
O Clínico Geral tem um lugar priveligiado, com o conhecimento da família. Pode desdramatizar uma situação penosa, dar conselhos ponderados, incitar a uma reestruturação equilibrada, sem no entanto se imiscuir demasiado na vida privada do agregado.
O doente é sem dúvida a principal fonte de preocupação para o médico, independentemente da ajuda que a família venha a necessitar. Existe um acordo tácito que liga o doente ao médico cujo objectivo principal é o interesse do doente. Tem de se ter muito cuidado na transmissão de informações sobre o doente à família, pois pode desencadear-se um processo de luto antecipado. Este pode dificultar a comunicação entre doente e família, que pode acentuar o sofrimento num período terminal.
A família não deve ser sacrificada desde que tal não traga qualquer benefício para o doente, ou resulte dum capricho deste. Ela pode estar em grave risco, particularmente se o enfermo desempenhar um papel chave no seu seio. O médico deve sugerir medidas práticas que, não lesando os interesses do doente, aliviem a família de uma carga excessiva. Logo que a morte seja previsível, o trabalho de luto deve ser preparado na tentativa de minorar a fase depressiva ou de inadaptação que se seguem ao desaparecimento de um ente querido.
As situações que se podem encontrar são muitas, podendo ser analisadas graças a uma boa comunicação com o doente e com os familiares, para tentar caracterizar os diversos parâmetros da situação, que são os seguintes:
-O tipo de família, a sua composição e maturidade, contexto sócio-cultural, revelam na maioria das vezes um ou dois elementos com mais capacidade de intervir de forma eficaz e adaptada ao longo do processo patológico.
-As relações em torno do doente modificam-se de uma forma dinâmica, o que se representa esquemáticamente na figura 12.1.
Figura 12.1

Representação esquemática das relações que envolvem o doente
-O papel desempenhado pelo doente na família é muito importante. Há uma grande diferença se o indivíduo é um idoso reformado, ou um elemento activo,suporte da família. Numa concepção de família em que existe um núcleo de pessoas que representam a estabilidade e no qual os restantes elementos se apoiam, é evidente que o desaparecimento de um dos elementos deste núcleo é mais desestabilizador do que um dos que se situa à periferia.
-Antecedentes de cancro na família - isto tem tendência a ter uma influência muito forte, que no entanto pode ser favorável ou desfavorável. A proximidade temporal de dois cancros, a analogia da localização anatómica, o sexo dos doentes, reforçam a aproximação. Um homem que descobre uma perda de sangue nas fezes reage de forma diferente se o seu pai tivesse tido um pólipo intestinal, ou se a sua irmã tivesse acabado de falecer com uma neoplasia do recto.
-A evolução do cancro é uma das características que por si só origina as mais diversas situações. Ao longo do tempo, a doença pode revelar as mais diversas facetas; boas ou más surpresas, verdadeiras ou falsas certezas, fases de choque, de cólera, de desespero ou de serenidade, que se sucedem ou alternam sem nenhuma ordem lógica. As preocupações existenciais e as necessidades afectivas, são relegados em detrimento de problemas materiais, por vezes insignificantes. A evolução global da neoplasia tem uma grande influência, podendo o doente ficar rápidamente curado quase sem sequelas, ficar igualmente curado mas com sequelas major, ou morrer mais ou menos rapidamente.
-A família tem um papel ambivalente, por vezes protectora do doente, por vezes "doente" com a doença que surgiu no seu seio e que aflige de forma grave e potencialmente fatal um dos seus membros. Tem um papel protector complementar à dos médicos e técnicos de saúde. Ela pode ajudar o doente a suportar e a adaptar-se à doença. Pode acontecer que exista uma "concorrência" entre os familiares e os técnicos de saúde instituicionais, devendo esta tornar-se complementar e não competitiva.
-o cancro é o centro das dificuldades, é verdade que ele representa em certa medida, ainda que por vezes apenas de uma forma temporária, uma ameaça de morte e de amputação familiar. O cancro deve mobilizar todos os esforços do médico. O tratamento do cancro deve ser orgânico e específico, devendo no entanto o doente ser tratado como um todo, psicológico e social. Devemos criar um círculo em torno do doente que foi tratado, desdramatizar a situação e evitar a desinserção familiar. Isto vai favorecer o tratamento, permitir melhorar o doente e reduzir as perturbações familiares. Assim evita-se a um círculo vicioso em que o cancro é o terror que vai perturbar à família, prejudicando o doente, que se sente cada vez mais isolado, reagindo mal ao abandono; podendo, por seu lado, a família regeitá-lo cada vez mais.
Dependendo do estado anterior da família e das característica do cancro, o médico tem um papel determinante, no sentido de impedir que se instale o círculo vicioso negativo.

Família "doente"
Tal como noutras doenças, o diagnóstico do cancro no seio de uma família causa perturbações que é necessário conhecer, diagnosticar, prevenir e tratar.

Perturbações
A família fica privada no todo ou parcialmente das actividades do doente; por outro lado, os restantes membros vão desempenhar actividades suplementares. As principais dificuldades encontradas por uma família que tem um canceroso em sua casa são, o receio de deixar o doente sózinho (e por consequência, tentam estar sempre presentes); o facto de terem que dispender por vezes muito tempo nos centros médicos; a necessidade de preparação de refeições especiais; a falta frequente de ajuda afectiva. Estas dificuldades são agravadas por uma morte recente de um outro membro da família por cancro, pelas alterações que alguns dos elementos têm que fazer nas actividades profissionais para melhor ajudar o doente, ou pela falta de amigos que possam dar uma ajuda complementar. Face ao diagnóstico de cancro a família é confrontada com a morte, e tal como o doente, as reações de choque, de negação e cólera vão acontecer, por vezes dirigidas ao médico que faz o diagnóstico. Paralelamente, existe uma atitude ambivalente de esperança na melhoria e cura do doente. A isto junta-se por vezes um sentimento de culpa por não se ter preocupado mais cedo com a saúde do doente.
A evolução da neoplasia coloca em causa o equilibrio de uma célula familiar e pode traumatizar particularmente as crianças. Nos adolescentes, as responsabilidades que lhe vão ser exigidas e o enfrentar de uma forma lúcida e corajosa a situação penosa, pode precipitar uma maturação precoce; pelo contrário, podem existir reações de fuga ao meio familiar, consumo de droga ou actos delinquentes.
Em caso de evolução fatal a família vai fazer um processo de luto que nunca é simples e muitas vezes é patológico.
Estas alterações podem ser exarcebadas pelo mito do cancro que pode fazer com que a família seja considerada como "pestífera". Isto tem consequências desagradáveis, nomeadamente na escola e nos locais de trabalho.
As perturbações, ainda que aparentemente sem grande importância, podem acumular-se, adquirindo grande peso na vida do dia a dia. Um doente canceroso perde muitas vezes parte da sua autonomia, necessitando da ajuda da família. Estas tarefas adicionais podem ser a gota de água no equílibrio da família já habitualmente muito ocupada.
A doença acarreta também problemas económicos, que serão mais graves se o elemento afectado for um dos que sustenta a família.
Se o médico conhecer os factores de risco que expõem uma família a perturbações mais sérias, a sua atenção para com esta deve ser redobrada. Os principais factores são:
-antecedentes psico-patológicos de um ou mais elementos da família;
-condições socio-económicas precárias;
-uma família de estrutura rígida;
-uma família com crianças pequenas;
-ocorrência de reacções excessivamente intensas e/ou porlongadas após o diagnóstico da situação.
A existência de um ou de vários factores anteriormente enunciados, deve levar a intervenções suplementares ou a um reforço das ajudas sociais.

Ajudas possíveis à Família
Face aquelas perturbações várias ajudas são possíveis.
Tudo o que melhore a vida do doente vai melhorar a vida dos parentes. Se os cuidados prestados ao doente não forem os adequados, a família vai mobilizar-se, por um lado para complementar os cuidados prestados, por outro, para reclamar da falta de cuidados para com o doente. É necessário pois tentar resolver o melhor possível os problemas de ordem prática:
-reduzir ao mínimo as hospitalizações, e internar o doente sempre que ocorrer uma complicação;
-ajudar a família dando conselhos de forrma a que o doente possa permanecer da melhor maneira no domicílio;
-limitar as deslocações a um centro especializado, quando estas forem dispensáveis;
-reduzir, ou suprimir se possível a espera, na altura das consultas ou dos tratamentos, pois esta situação é não só penosa para o doente como para o acompanhante.
A informação da família representa um aspecto muito importante nas relações com a equipa terapêuta. Os familiares devem poder receber informações quando as pedem, particularmente quando esta solicitação tem como pano de fundo uma ansiedade devida a falta de informação ou a informações incorrectas.
A experiência mostra a extrema diversidade de informações a dar, pedidas ou não. Por um lado, existem as informações práticas que é necessário banalizar o mais possível; por outro, as informações que devem ser personalizadas, como por exemplo as que dizem respeito ao prognóstico.
Habitualmente o diagnóstico é transmitido a uma pessoa da família ao mesmo tempo que ao doente, não sendo da responsabilidade do médico a transmissão do diagnóstico a outros elementos da família. Se for considerado útil informar apenas um parente acerca da situação, e não o próprio doente, devem ser tomadas as devidas precauções contra as informações involuntariamente transmitidas no seio da família. A desconfiança que se pode instalar se tal acontecer é quase sempre pior do que a verdade. O Clínico Geral está numa posição privilegiada para ajudar a tomar a decisão.
É necessário deixar claro que a doença não é contagiosa, não sendo necessária nenhuma medida de protecção ou isolamento, a menos que tal seja feito para conforto do doente.
O programa de tratamento deve ser fornecido em linhas gerais, de forma a que a família possa programar as actividades profissionais ou as férias com um mínimo de incómodo.
Quando existe uma evolução desfavorável e o doente entra numa fase terminal, é necessário dar indicações práticas de cuidados elementares. Muitas vezes é uma enfermeira, dietista ou assistente social que está melhor preparada para o fazer.
Quando a vida do doente está ameaçada, é necessário ter em conta os interesses do doente, nomeadamente o de não ser considerado prematuramente como já desaparecido.
Uma ajuda material a famílias mais necessitadas, deve ser sempre considerada, devendo o médico pedir a colaboração da assistência social sempre que o julgar pertinente.
Um dos riscos da presença destes doentes no seio da família é que eles monopolizam as atenções dos elementos activos. Tal facto verifica-se mais em situações terminais que evoluem no domicílio e se arrastam no tempo. É necessário por vezes ajudar este elememto a tomar consciência do que está a acontecer e motivá-lo para ter a visão de conjunto necessária em relação á família.
Quando o doente morre por cancro ou por qualquer outra causa, é possível facilitar o processo de luto. Será necessária uma visita sistemática pelo Médico de família ou por um enfermeiro? Será necessário apenas ficar disponível para os familiares do doente? É certamente necessário tomar uma atitude de disponibilidade para pessoas que muitas vezes nem conhecemos, para conversar com calma, particularmente de alguns sentimentos em relação ao defunto (ex.: sensação de culpa por não poder estar presente nos últimos momentos de vida) mais ou menos expressos, mas que com algum tacto se pode dialogar sobre eles, propocionando desta forma algum alívio aos familiares.

A Família Como Complemento da Equipa Terapêuta
Para a maioria dos doentes, a assimilação de detalhes práticos de um tratamento é essencial, em detrimento da compreensão, ainda que duma forma elementar, da patogénese da doença e do modo de acção da terapêutica. Um elemento da família pode ter um papel muito importante na ajuda à memorização e explicação de certos detalhes do tratamento ou de gestos práticos a efectuar em casa. Indicações precisas e simples vão ajudar a família e o doente a organizarem-se, obtendo-se desta forma uma melhor adesão ao tratamento.
A família é muitas vezes um suporte importante no apoio material ao doente, quer com contribuição directa de dinheiro, quer com a mobilização de meios que põem ao dispor do doente (ex. leva-lo de automóvel ao tratamento).
O doente pode necessitar de pequenos cuidados: pensos, desinfecção da cavidade bucal, cinésioterapia... que podem ser assegurados por ou com a ajuda de um dos elementos da família. Neste caso, as instruções devem ser dadas de forma precisa: periodicidade, o que utilisar, a evolução prevista, etc... No período terminal, o médico deve reforçar a ideia que o doente não deve ser abandonado, que deve continuar a receber os cuidados até então prestados, para assegurarem o seu conforto.

Conclusão
O apoio à família de um doente canceroso tem toda a pertinência, particularmente porque o mito do cancro arrasta consigo toda uma série de ideias pré concebidas e de reacções pouco racionais.
As necessidades da família são várias e mudam com a evolução da doença. O médico para poder ajudar tem que ouvir e tentar procurar os problemas que foram mal expressos ou que estão camuflados.
O médico deve ter uma atitude ponderada, não se intrometendo nos assuntos intímos da família, a menos que estes impliquem danos quer para o doente quer para a própria família. A sua disponibilidade e a sua abertura não devem dar lugar a más interpretações.
Uma boa comunicação é fundamental. É contraproducente criar um muro de silêncio em torno do doente e da família, que só iria agravar a situação penosa que estão a viver.

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